quarta-feira, 3 de fevereiro de 2016

Abertura, uma questão de sobrevivência (Comércio exterior)

  • Abertura, uma questão de sobrevivência (Comércio exterior)

    Por Vicente Assis
    O Brasil, ao longo de sua história, viveu dois momentos importantes que tiveram impacto significativo em seu desenvolvimento e crescimento: a abertura dos portos, em 1808, e a abertura - ainda que limitada - do mercado brasileiro na década de 1990. O primeiro marcou a transição do Brasil de colônia para uma verdadeira nação e o segundo, o início da efetiva modernização de sua economia.
    Hoje é evidente a necessidade de nos inserirmos de forma muito mais significativa na economia global. O bônus demográfico que tanto beneficiou o país nos últimos 50 anos está perto do fim. Elevar a produtividade do brasileiro que, desde 1990, cresceu apenas 1%, hoje é um imperativo. A maior abertura do mercado brasileiro é uma das alavancas mais poderosas para atingir esse objetivo. Não podemos mais postergá-la.
    A economia brasileira equivale atualmente a 3,5% do PIB global mas suas exportações representam apenas 1,4% do total mundial. Há espaço para mais que dobrar a participação brasileira. Esse equilíbrio representaria a adição de US$ 200 bilhões em receitas, ao mesmo tempo que permitiria elevar as importações em patamar semelhante sem impactar o déficit externo.
    A maior integração econômica tem de vir junto de acordos com parceiros que tragam valor para o país
    Levantamento do McKinsey Global Institute (MGI) mostra que a maior conectividade com fluxos econômicos globais poderá aumentar em cerca de 1,25 ponto percentual o ritmo de crescimento médio anual da economia brasileira. Essa expansão virá, principalmente, de incentivos à adoção de melhores práticas globais por empresas e pelo aumento na renda vinda do acesso a bens e serviços de qualidade e mais baratos - algo frequentemente esquecido.
    O espaço a ser percorrido é enorme. Num ranking que compara o nível de abertura de 70 países, o Brasil aparece na 65ª posição, superando Etiópia e Sudão, mas atrás de Uganda. É, também, o mais fechado entre integrantes do G-20.
    A situação é ainda pior pela quase inexistência de avanços na direção de uma maior integração com o mercado mundial. Entre os Bric, todos os países têm níveis baixos de abertura, mas o Brasil foi o único do grupo que não melhorou sua posição no ranking global entre 2011 e 2015.
    A desculpa que a infraestrutura precária é culpada pela falta de integração é frágil. No Brasil, a infraestrutura para comércio exterior é apenas mediana, mas comparável à do muito mais aberto México, revela comparação da International Chamber of Commerce (ICC) com 75 países. O problema mais grave no Brasil é a falta de políticas favoráveis a uma maior abertura. As amarras protecionistas e regulatórias brasileiras são comparáveis às de nações muito menos desenvolvidas, como Sudão e Nigéria. O Brasil tem todas as condições para ser mais aberto. Basta querermos.
    A falta de iniciativa em buscar mais integração é outro fator. Quando as negociações da Rodada Doha chegaram a um impasse, muitos países buscaram acordos bilaterais com parceiros comerciais fortes para compensar a falta de consenso. O Brasil, porém, foi muito pouco ativo e inicialmente privilegiou tratados com mercados de pouca expressão.
    As importações brasileiras representam apenas 11% do PIB nacional, quando a média global gira em torno de 40%. Num grupo de 140 países, apenas Nigéria e República Centro-Africana têm taxas de importação em relação ao PIB menores que a do Brasil. Mesmo sendo a 8ª maior economia do mundo, o Brasil não é relevante para os maiores exportadores - apenas 3% das exportações dos EUA, 2% da China e 1% da União Europeia vêm para o país.
    A abertura passa também pelo reconhecimento da importância dos fluxos de serviços e de pessoas. Muitas vezes menosprezados, eles têm enorme impacto potencial sobre a atividade econômica, a abertura de vagas e a capacitação da força de trabalho. O limitado fluxo de pessoas é clara evidência do quão pouco integrado o Brasil está. No Chile existem 261 assentos em voos internacionais para cada mil habitantes, contra apenas 64 para cada mil residentes no Brasil.
    O protecionismo mais prejudica o país do que o protege. Reduz sua competitividade, desestimula a inovação e tem impacto negativo direto sobre a produtividade. Apesar de todas as políticas protecionistas do país, alguns setores brasileiros expostos à concorrência global, como a agricultura, conseguem níveis de produtividade comparáveis aos de países desenvolvidos. No Brasil, a produção média de algodão por hectare chega a 3,6 toneladas, contra 2,3 toneladas nos EUA. O mesmo se observa para a soja.
    A maior integração econômica contribuirá diretamente para elevar a produtividade, tanto pela pressão competitiva que trará consigo, como pela inserção em cadeias de produção global. Não se deve temer a competição. A melhor forma de se tornar forte é competindo e evitando ambientes artificialmente protegidos por longos períodos.
    O caminho para a abertura passa necessariamente por alterações radicais nas políticas comerciais brasileiras. Uma substancial redução de subsídios, tarifas de importação e requerimentos de conteúdo local servirá de incentivo à modernização. O ambiente mais competitivo proporcionado pela abertura forçará que organizações busquem meios mais eficientes, inteligentes e baratos de produzir e atuar - elevando a produtividade, como desesperadamente precisamos.
    A simplificação da burocracia também abrirá caminho para aprimorar fluxos de comércio, elevando a oferta de produtos para o consumidor e reduzindo custos para empresas.
    Por fim, a maior integração econômica tem de vir acompanhada por acordos com parceiros comerciais que realmente tragam valor para o país. Essa relação estimulará a modernização e a eficiência no setor privado nacional, graças a uma concorrência ampliada e saudável. Não é suficiente competir com economias menos desenvolvidas que a nossa.
    Em poucos momentos no passado uma maior integração do Brasil com o mundo foi tão necessária. Não se trata mais de agir para abastecer uma corte imperial ou para substituir carroças por carros. Estamos falando da sobrevivência de nossa aspiração de sermos uma nação relevante no cenário mundial.
    Vicente F. Assis é presidente da McKinsey & Company no Brasil.
    Fonte Internet: Valor Econômico, 02/02/16
  • http://www.abece.org.br/Noticias/ComercioExteriorRead.aspx?cod=6873

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