ADVOGADO APRESENTA, NO CIST, PARTICULARIDADES DOS
CONTRATOS DE SEGURO DE TRANSPORTE MARÍTIMO INTERNACIONAL
Escrito por CLIPPING Publicado em Navegação e Marinha do
Brasil
O advogado Christian Smera abordou as normas e regras do
direito marítimo internacional em palestra no encontro mensal do CIST (Clube
Internacional de Seguro de Transportes), dia 14 de abril. Para a plateia
formada por profissionais de seguros de transportes, entre seguradores,
corretores de seguros e prestadores de serviços, ele trouxe casos de sinistros
envolvendo navios de transporte e comentou particularidades dos contratos
brasileiros e internacionais. “Em maior ou menor medida, todos que estão aqui
entendem um pouco de normas e regras do direito marítimo internacional, avaria
grossa etc. Existe uma beleza em trabalhar neste ramo por envolver tantos e tão
ricos universos. E nesse setor, os estrangeiros nos veem com muita competência,
proficiência e expertise”, disse.
O primeiro caso apresentado foi a colisão de dois navios
porta-contêineres ocorrida na Malásia em 28 de outubro de 2014, que chamou a
atenção para a importância do seguro de transporte internacional. O acidente
ocorreu em manobra de entrada do navio San Felipe no Porto de Klang, quando
colidiu com o navio Al Riffa, que se encontrava atracado e operando.
“Era a viagem inaugural de um navio maravilhoso, de
última geração, transportador de 10 mil containers de 20 pés. Foi um erro de
manobra. Teoricamente, um comandante de navio deveria ter experiência, mas
pelas estatísticas, em 2006 existiam 4600 navios porta-contêineres no mundo,
hoje, 10 anos depois, existem 28 mil. Onde foram formados esses 22 mil
comandantes? É bastante complicado, não temos mais uma Escola de Sagres, os
navios não são mais caravelas, são ‘monstros’ com uma série de dispositivos que
ajudam na navegação, mas que precisam de um comandante”.
Na batida, os contêineres com carga perigosa explodiram
deixando 140 contêineres perdidos, quase todos destinados ao mercado
brasileiro. O outro navio, que era maior ainda, também teve uma perda
significativa. “A regulação do sinistro no Brasil funciona da seguinte forma: o
transportador recebeu a carga, tem dever de incolumidade, principio jurídico
reparatório da estrita responsabilidade civil – o transportador errou, ele
paga, a não ser que invoque excludentes. Só que a regra no exterior é oposta à
nossa: quem nomeia o comandante do navio não é apenas o dono do casco, não
apenas a empresa que explora a armação comercial do navio, mas o embarcador
também. Quando entrega a carga você está nomeando-o seu preposto e dividindo o
risco. E o que é combinado não é caro, está no contrato firmado por eles”,
afirmou. “A diferença desse contrato é que o conhecimento marítimo é
rigorosamente nulo no Brasil, é um contrato de imposição. O direito brasileiro
afasta este tipo de contrato. Essa dicotomia entre países pode gerar dúvidas,
discussões e processos”, ponderou.
Segundo o advogado, em um mercado apertado com a crise,
as cláusulas de ressarcimento passam a ser vitais. “É preciso ter equilíbrio
atuarial do seguro, não só pagar nem só receber, principalmente numa catástrofe
como essa”.
Outro caso foi apresentado por Smera como o de maior
repercussão nos últimos tempos, “a maior avaria grossa da história”. O grave
acidente de navegação ocorreu no dia 25 de abril de 2015 envolvendo o navio
Maersk Londrina, um porta-contêiners que faz a linha regular entre portos
asiáticos e brasileiros, após escala em Tanjung Pelepas, na Malásia, com
destino aos portos de Santos. O navio sofreu explosão seguida de incêndio no
interior do porão nº 7 quando estava em trânsito no Oceano Índico, a cerca de
1.300 quilômetros das Ilhas Maurício. O comando de bordo solicitou assistência
de salvamento à empresa Svitzer, sendo rebocado até Port Louis, nas Ilhas
Maurício, onde houve o resfriamento e prosseguimento ao combate ao incêndio.
“Toda conduta onerosa, ou seja, tudo o que o comandante
da embarcação gasta e sacrifica para salvar um navio em sinistro, com carga e
combustível dele, tem o direito de repartir este custo. Se o sacrifício envolve
jogar a carga para a água, o que se chama de alijamento, a carga que foi
alijada para que o navio fosse salvo será paga por todo o condomínio (navio,
carga, combustível)”, explicou.
“O comprador fez uma encomenda de desinfetante da China,
e que quem vendeu entregou uma mistura de hipoclorito de cálcio, absolutamente
explosiva, que explode se estiver a mais de 55°. De modo a economizar em tarifa
de frente porque carga perigosa é cobrada mais, embarcou como desinfetante. E
houve o enorme azar de a equipe armazenar do lado da sala de máquina e das
serpentinas de vapor. Foram perdidos 340 containers do mercado brasileiro, mais
ou menos US$ 11 milhões”, relatou. “O armador do Maersk Londrina teve que
contratar uma série de rebocadores para fazer o esfriamento, toda a assistência
dada a esse navio no sentido de conter o incêndio entra na conta de rateio da
avaria grossa. Como o navio estava afundando, prestes a explodir inteiro, o
comandante resolveu alagar o porão, e quando encheu de água, o que não estava
queimado ficou molhado. O que queimou é acidente, mas o que molhou é
voluntario, é sacrifício, então é avaria grossa”.
Outro caso apresentado foi o do navio Feeder, da libanesa
Haidar, que tombou no cais do porto de Vila do Conde, em Barcarena, nordeste do
Pará, carregando cerca de 5 mil bois vivos, no dia 06 de outubro de 2015.“O
Feeder é um pequeno navio transportador de contêiners que foi transformado em
um navio gaiola para transportar bois. Anualmente o Brasil exporta cerca de 8
milhões de gado vivo para a Venezuela e o Pará virou um grande pasto para isso.
A carga é distribuída perfeitamente em gaiolas, mas o navio começou a adernar
súbita e inexplicavelmente, e o navio virou. No mundo inteiro se qualquer carga
viva falece não é responsabilidade do armador, isso é tido como um risco
inerente, não existe culpabilidade nem ressarcimento. Se embarcou no navio está
ciente que pode morrer. Exceto no Brasil, porque aqui se o transportador perder
uma carga, seja uma máquina ou um boi, vai ter que pagar”, revelou. “A
seguradora brasileira, neste sinistro, fica numa situação diferente. Além da
diferença de regras entre os países, no momento do tombamento ainda não sido
emitido o contrato de transporte, pois faltavam entrar 20 bois no navio e o
contrato de transporte marítimo no Brasil é emitido quando o último ‘passageiro’
entra. Então a seguradora não estava implicada em qualquer norma. Mas isso vai
dar uma disputa jurídica grande. Será que o subscritor desse risco sabia que em
caso de sinistro envolvendo os bois não haveria o ressarcimento? Duvido e isso
faz toda a diferença”.
A palestra deixou clara a importância de conhecer todas
as regras dos países com quem se negocia no transporte internacional e contar
com assessoria de profissionais especializados neste assunto.
Fonte: Thais Rucom| CIST News